The Japanese Girl: chá cósmico e guitarras loucas no Reverence Valada 2016
Pura diversão lo-fi + guitarras psicadélicas + guelra nacional. Levada ao lume, a receita traduz-se num chá cósmico que mata a sede de quem procura, incansavelmente, mais do psicadélico nacional. The Japanese Girl é o nome de uma das bandas nacionais que mais me agrada destacar para esta edição do Reverence Valada. O nome da banda, só por si, dá-lhes pontos extra, mas a figura sonora que se cria nestas moléculas sonoras, toma uma forma real através da química e dos acordes de um grupo de amigos do Porto que, entre a classe e o bom gosto, não faz a coisa por menos e edita um disco em 2015 chamado Sonic Shapped Life.
Não há um retrato visual nítido desta Japanese Girl, mas lendo nas entrelinhas, podemos vê-la a sorrir, algures entre óculos escuros, um cigarro aceso, roupa preta e umas botas consideráveis. Uma cool girl, definitivamente, com a garantia do caminho aberto para a continuação da construção da linguagem sonora que no primeiro EP já tínhamos ouvido, editado no final do ano passado.
Ouvindo o álbum de estreia, parece complicado descolar do tema “I’m In Dreamland”, que depressa entra na playlist de uma viagem para casa ou como companhia para uma noite mal dormida. Já o primeiro tema do disco, single de apresentação desta vida-sónica dos Japanese Girl – “You Should Have Switches”, oferece de bandeja o rock psicadélico das guitarras, o stoner na voz, o videoclipe perturbadoramente fixe e a atitude couldn’t care less – doseada, o suficiente – para ser sexy.
Foram uma das bandas a dar música ao 3.º aniversário da discoteca Sabotage, em Lisboa (por onde também já tinham passado), e já apresentaram o novo disco por várias cidades nacionais, de Leiria a Guimarães. Estiveram também em digressão por Madrid, Léon ou Guadalajara e estão dia 9 de Setembro, no festival Reverence Valada.
Bruno, Corinna, Emanuel e Carlos são os fantastic four aos comandos deste projeto que não passou despercebido aos ouvidos de Nick Allport, o homem por trás do Reverence Valada. Foi ele que veio do Reino Unido para o Cartaxo, já há uns anos, tornando sua a realidade utópica de muitos, no desejo necessário de mudar de vida e educar os filhos longe da loucura frenética das cidades. A vida mudou, mas a música quis seguir religiosamente Nick Allport e não lhe deixou outra hipótese senão apostar, novamente, na divulgação do rock que desde os tempos da vida anterior lhe chegavam às mãos.
Com o tempo, o movimento que Nick Allport registou como as Cartaxo Sessions (e que mudou, naturalmente, o panorama musical da região), falava mais alto através da organização e divulgação de novas bandas dentro da cena rock/alternativa/psych, através de concertos que aconteciam no Centro Cultural do Cartaxo. Mas para Nick foi preciso mais. E para nós também. Também com o tempo, a luz apareceu – não ao fundo do túnel, mas fora de portas.
Fazer nascer o Reverence Valada tornou-se a resposta para Nick, num festival que veio preencher um nicho gigante para uns e se tornou na aventura musical de tantos outros. Em 2016, e na aposta em edições cada vez mais fortes, o cartaz está cheio de argumentos de peso para viajar até ao Ribatejo, de 8 a 11 de Setembro. Sisters of Mercy, The Brian Jonestown Massacre, Raveonettes, Yawning Man (tanto!), Dead Meadow ou Thee Oh Sees são imperdíveis e obviamente, o palco Indiegente (!) a dar que falar, com bandas nacionais que a casa já conhece de cor.
A par dos Japanese Girl, fica também a nota para verem no Reverence (ou num palco perto de vós) os Sunflowers, que editam disco de estreia a 19 de Setembro, e que se têm afirmado como representantes de honra da cena pós-punk/psicadélica do Porto, e ainda para os Twin Transistors, de Leiria, que fazem do seu Sun Of Wolves, um motivo maior para olhar de frente o horizonte musical contemporâneo.
Nuno Calado na curadoria no palco Indiegente e a Antena 3 representada em mais um festival, deixa a certeza que a música nacional é tanto e tão mais forte do que é possível às vezes escrever. Dirty Coal Train, Nicotine’s Orchestra ou a nova cena Correia são obrigatórios, num mar de possibilidades psicadélicas que vai certamente (continuar a) fazer ondas nos próximos dias. Citanto o Josh Homme, será um go with the flow, nestas águas de re(f)verência.
Vanessa Augusto
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* Vanessa Augusto é licenciada em Ciências da Comunicação pela UNL, faz parte da equipa de divulgação de conteúdo cultural da Antena 3 desde 2011 e é a voz das madrugadas diárias da 3. Também faz televisão e é nas águas do indie rock que gosta de navegar – se possível, com baton vermelho posto.