O Quim não tem sítio. Está em todo o lado. “Nas casas, nos carros, nas pontes, nas ruas” — como diz a música.
O Quim, elevado ao expoente máximo, controla muita coisa, é o desenrascado, e, se tiver sorte, ninguém o agarra, faz alguns negócios do outro mundo e fica quase dono deste. O Quim aparece em todo o lado. O Trainspotting, que estará de regresso em breve, está cheio deles.
Quem é o Quim? Todos conhecemos um, dois ou até mesmo três desenrascados, soltos, sem medo de arriscar e com lábia, jogo de cintura e empreendedorismo que chegue para entrar de caras na Liga dos Campeões ou em supertaças.
O Quim é uma personagem, a principal de uma música que é mais uma curta-metragem do que uma música. Os Pro’seeds conseguem que as imagens passem por nós durante os 3 minutos e 39 segundos. É muito difícil, mas as músicas têm essa capacidade, a de nos fornecerem imagens numa espécie de toca-e-foge. Aparecem e desaparecem.
No caso desta faixa de Soft Power Sagrado, as imagens não aparecem e desaparecem. Estão sempre lá. Conseguimos ver tudo e ouvir tudo. Todos os dias a passamos na Antena 3, e todos os dias tenho a mesma sensação — a de que estamos a passar um vídeo na rádio, como se isso fosse possível…
Podes tirar o Quim da selva, mas o Quim será sempre, em parte, selvagem. No fundo, é essa a mensagem dos Pro’seeds nesta faixa que fala sobre alguém que era pastor, mensageiro, raver, alpinista, surfista, nadador, passador, morcego, pastilhado, cheirado, visionário, ambicioso, destemido e romântico, nos anos 90. Muita coisa para um homem só.
Ia ao Rocks, em Gaia, ouvir os pesos-pesados; antes, passava pelo Comix; às vezes, ia ao Hard Club. Andava sempre “na sua, sempre cheio de speed”. É a sugunda citação de uma música nestas poucas linhas, mas estas têm linhas em comum. O Chico Fininho e o Quim são familiares separados por 20 anos na mesma Cidade Invicta. Um ouvia Lou Reed, e o outro era mais DJ Vibe e Carl Cox.
Outro pormenor junta o Quim ao Chico Fininho: o pai de Berna, que juntamente com Serial e DJ Score forma a temível esquadra Pro’seeds, no final da década de 70 tocava bateria. Adivinhem com quem. Isso mesmo, com Rui Veloso. Os ensaios aconteciam muitas vezes em casa dos pais do baterista, ou seja, dos avós de Berna. O mundo é mesmo pequeno para tantas voltas.
Rui Estêvão