Chegou a altura de fazer contas ao ano… A Antena 3 desvenda hoje os 30 melhores discos internacionais de 2016!
A equipa da 3 elegeu os álbuns mais marcantes para a cultura pop. São os 30 discos que mais surpreenderam, que revelaram os artistas a manter debaixo de olho e os músicos de sempre, que não desiludem.
Até ao final do dia, a 3 vai revelar a lista completa. Fica atento à emissão!
30. Anhoni – Hopelessness
Hoplessness é o primeiro disco de Anhoni, o recomeço depois de 10 anos de Antony and the Johnsons. Na verdade, Antony não mudou apenas de nome, mudou de identidade musical. Manteve o dramatismo, o vibrato no limite da emoção, mas encontrou na electrónica a densidade que precisava para fazer passar a mensagem.
Hoplesseness tem beats de dois produtores conotados com o lado mais radical da electrónica actual: Hudson Mohawe (que também empresta talento a Life of Pablo, de Kanye West, outro disco em destaque este ano) e Oneohtrix Point Never (aka Daniel Lopatin), herói da electrónica retro cósmica. Ambos criam o cenário musical que as canções negras e politicamente empenhadas de Anohni pedem. Hoplessness é um disco sobre o mundo em que vivemos: a crise social ,emocional e política, o ecofeminismo, a tragédia ecológica e humanitária.
“Drone Bomb Me” foi a canção que mais rodámos na Antena 3 este ano: é escrita do ponto de vista de uma criança afgã, que pede a morte depois da sua família ter sido bombardeada.
29. Céu – Tropix
O nome de Céu pode não ser muito familiar em Portugal mas esta cantora e compositora de São Paulo lançou 3 discos antes deste Tropix, que aparece em vigésimo nono lugar.
Produzido pelo francês General Elektrics e Pupillo, baterista da Nação Zumbi, Tropix combina o mel tradicional da música brasileira, sobretudo bossa nova, com as correntes electrónicas modernas que, sem puxarem para a pista, garantem o balanço do corpo.
Suave mas preciso, Tropix é o disco mais electrónico e sofisticado de Céu, talvez o mais estranho também dada a produção intrincada de algumas canções como “Camadas” e “Rapsodia Brasilis”, por exemplo.
28. Blood Orange – Freetown Sound
Devonté Hynes é o que se chama um personagem. Escreveu canções para estrelas pop ,como Florence and the Machine, FKA Twigs ou Chemical Brothers, mas também trabalhou com Skepta, um dos grandes da cena grime britânica, é musico e produtor, escreve livros, faz banda desenhada e não tem medo de se envolver em causas.
Devonté Hynes, londrino a viver em Nova Iorque, é Blood Orange, autor de Freetown Sound, em vigésimo oitavo lugar na lista de discos internacionais de 2016. Freetown Sound é o terceiro álbum de Blood Orange, um disco que o próprio Dev Hynes declara como autobiográfico no sentido em que faz uso da sua historia pessoal e fala de como é ser negro em Inglaterra e ser negro nos Estados Unidos.
Corte e colagem de partículas de som, pedaços de música, mas também de filmes, reflexão social, mensagem política e colaboradores de peso como Nelly Furtado e Debby Harry. Freetwon Sound não é um disco vulgar e é o seu lado arrojado que o coloca na nossa lista de melhores do ano.
27. Charles Bradley – Changes
Na vigésima sétima posição temos um herói de 67 anos, um soulman sem idade. Charles Bradley, “The Screaming Eagle of Soul”, o homem que passou a maior parte da vida a tentar ser James Brown até ser descoberto pela Daptone Records, no inicio deste século, e assim cumprir finalmente o sonho de ser ele próprio. Changes é o terceiro álbum de Bradley, que pede emprestado o título a uma canção dos Black Sabbath, que é revista no disco em contexto retro soul, para falar realmente de mudança. Bradley mostra-se à vontade consigo e com a sua história de vida, usa isso para encher ainda mais os pulmões e cantar o amor a dúvida e a fé com mais entrega do que nunca.
Numa idade em que quase todos os músicos pensam numa retirada estratégica, ou, quanto muito, num regresso oportuno, Bradley vive na plenitude o seu recém conquistado estatuto de estrela e a pele assenta-lhe bem, mesmo que a doença comprometa as suas acções e tenha levado ao cancelamento da digressão internacional que deveria tê-lo trazido a Portugal este ano.
26. Wilco – Schmilco
Schmilco, décimo álbum dos Wilco, é um disco essencialmente acústico, melódico e nostálgico, a Rolling Stone até lhe chamou pastoral. Schmilco acredita na eficácia das coisas simples, não divaga. É folk introspectiva com alguns ângulos experimentais, mas suaves, quase sempre contemplativa e simples, sem pretensões de pertencer a nenhum clube da moda. Um disco que contrasta com Star Wars, do ano passado, em que a banda soava mais eléctrica e ruidosa, mas que na verdade nasce das mesmas sessões de gravação.
É isso que mantém os Wilco interessantes 21 anos e 10 álbuns depois de terem nascido das cinzas de Uncle Tupelo: a capacidade de se reinventarem sempre a partir da matriz de country alternativo, que também é rock alternativo.
Schmilco é um disco de atribulações tranquilas que evoca as memórias da adolescência de Jeff Tweedy.
25. Avalanches – Wildflower
Foram precisos 16 anos para que o colectivo australiano, conhecido por usar 3.500 samples no seu álbum de estreia, voltasse a dar notícias. E o longo hiato também tem a ver com samples, ou melhor, com a licença para os usar. Só limpar e ter autorização para usar todos os pedaços de musica alheia demorou 5 anos. O resto tem a ver com circunstâncias da vida, fecho da editora, doença e perfeccionismo. Seja como for, Wildflower, o segundo álbum dos Avalanches, mantém afinidades com Since I Left You, o primeiro disco. Desde logo, as raízes hip hop permanecem, no uso intensivo e inventivo de samples, mas são reforçadas pelas colaborações de rappers como Danny Brown, MF Doom ou o veterano Biz Markie.
Wildflower estende-se em várias direcções com a ajuda de gente como Toro Y Moi, Father John Misty, Mercury Rev John Donahue ou Jennifer Herrema de Royal Trux. Diverso e rico nos pormenores, Wilflower é como uma fantasia musical, hip hop com toques psicadélicos.
24. Kanye West – Life Of Pablo
O sétimo álbum de Kanye West, como quase tudo aquilo em que Kanye toca, foi um disco polémico, logo na génese que se revelou um “work in progress”, com várias alterações, adendas e revisões antes da versão definitiva assentar, se é que não pode vir ainda a ser alterada. Até a capa foi polémica. Kanye West é um génio volátil venerado e odiado em proporções idênticas, patologicamente egocêntrico para uns, mestre da ironia, do teatro e do marketing para outros. Life of Pablo é tudo isso e ainda mais.
As skillz de Kanye enquanto produtor continuam apuradas, a sua capacidade de encontrar fontes de som também. Em Life of Pablo há samples mais ou menos improváveis de Mr Fingers, Masters At Work, Arthur Russell, Alison Goldfrapp e até Drake. Kanye está atento e rodeia-se das pessoas certas. Life of Pablo tem toda a gente, ou quase, produtores como Hudson Mohawke, Karriem Riggins, Pharrell Williams ou Madlib, colaborações de Kendrick Lamar, Frank Ocean, Weeknd ou Rhianna.
Um dos casos do ano, sem duvida, este Life of Pablo, sobretudo tendo em conta o recente “colapso” de Kanye.
23. Savages – Adore Life
Adore Life é o segundo álbum do quarteto feminino de Londres empenhando em reinventar o pós punk. Um disco sobre o amor e os seus males, mas também as suas virtudes, que gosta do ruído e da saturação, de guitarras angulares, emoções intensas e viscerais. As Savages são uma das bandas sensação dos últimos anos, personificam de algum modo o mesmo espírito que movia bandas como Siouxsie and The Banshees, Nick Cave dos primeiros tempos ou alguma Pj Harvey, mas fazem-no reforçando a sua identidade enquanto banda alternativa do sec XXI.
Adore Life sublinha tudo isso. Pormenor curioso num dos discos de rock com mais nervo deste ano, quem misturou o disco foi Trentemoller, multi instrumentista e produtor dinamarquês ligado ao techno minimal, mas que tem muito indie rock no ADN.
22. The Kills – Ash & Ice
A dupla Alison Mosshart / Jamie Hince lançou este ano Ash & Ice, o primeiro disco em 5 anos, o quinto numa discografia que se estende por década e meia, um álbum de rock suado e intenso, bem dentro do espírito de garagem onde estão as raízes da banda, mas que também tem espaço para batidas electrónicas e outras divagações. Apesar das diversões, Ash & Ice é um disco de rock que se assume como derivação dos blues, é dinâmico na energia, introspectivo nas palavras e bastante negro no geral. No fundo, são os mesmos Kills de sempre, entre o fogo e o gelo, mas mais confiantes na sua pele, em particular Allison Mosshart, certamente uma das vozes mais carismáticas do rock actual.
21. Mayer Hawthorne – Man About Town
Man About Town é o quarto álbum de Mayer Hawthorne, o homem que recuperou a blue eyed soul para o território pop, com iguais doses de ironia e emoção. Entre as heranças da Motown, do Philly Sound e do boogie, Hawthorne descobre atalhos para uma pop de recorte clássico e ambições ousadas.
Man About Town prova que a retro soul continua a cheia de força e segura de si em 2016.
Especial Melhores Discos Internacionais 2016 (Episódio 1)
20. Michael Kiwanuka – Love and Hate
Love and Hate é um disco enraizado na soul, embora não apenas. O segundo álbum de Michael Kiwanuka, um britânico com raízes no Uganda, também deve aos blues parte da sua intensidade e, de um modo geral, tem um léxico musical alargado. Produzido por Danger Mouse, Love and Hate foi naturalmente um disco difícil, dada a atenção gerada pela estreia, em 2012, com Home Again. Kiwanuka teve que se afastar da pressão e reencontrar-se para conseguir encarar o tradicionalmente difícil segundo álbum.
Love and Hate é um disco sobre o amor e ódio, sobre ser negro num mundo de brancos, ter dúvidas e lutas interiores. Lembra a soul e o funk dos anos 70, até na complexidade da produção, mas sobretudo na voz, poderosa e doce de Michael Kiwanuka.
19. Two Door Cinema Club – GameShow
No décimo nono lugar da nossa lista de 30 discos internacionais de 2016, uma banda que esteve à beira do colapso, mas renasceu com um disco chamado Gameshow. É o terceiro álbum dos Two Door Cinema Club, trio irlandês que começou descomprometido e enérgico na procura de um lugar na pop, mas acabou por vacilar perante as pressões do estrelato. Entre o segundo álbum Beacon e o novo Gameshow estão 5 anos de silêncio provocados alegadamente por hospitalizações, alcoolismo e depressão. Os Two Door Cinema Club viram o precipicio mas saíram do buraco com um disco de pop com apelo de pista, alimentado pela nostalgia anos 80 e alguma paranóia em relação à era digital.
18. Jamiel Lidell – Building a Beginning
Em décimo oitavo, um musico que começou no techno desconstruído, ainda nos anos 90, com um projecto chamado Super Collider, mas acabou por revelar-se como crooner retro soul já em pleno século XXI: Jamie Lidell. O álbum Building a Beginning, sexto de jamie Lidell, é um disco de raízes, ou sobre criar raízes. Jamie Lidell casou, foi pai, juntou uma banda espantosa com quem tem tocado ao vivo em festivais seleccionados, e que inclui músicos de Jack White, D’Angelo e Wilco, e fez um disco cheio de amor em que a esposa, Lindsay Rome, tem um papel central na escrita das canções. É um momento de viragem na vida do britânico, agora residente em Nashville, mas também de reencontro com as origens, não as do techno, que parecem definitivamente postas de lado, mas com as da soul e da pop que tem vindo a explorar na sua carreira a solo.
17. Cass McCombs – Mangy Love
Mangy Love é o oitavo álbum do californiano Cass McCombs. McCombs sempre falou dos sentimentos e da América. As suas virtudes de escritor de canções passam muito por aí, mas em Mangy Love ganha uma carga política que antes não parecia tão visível. Comentário socio político misturado com introspecção impiedosa e uma visão muitas vezes cáustica da realidade, fazem de Mangy Love um disco para ouvir ao pormenor nas palavras como nos aspectos sónicos. Folk que não é só folk, também é psicadelismo, e também tem soul e rock anguloso. Mangy Love é um disco rico nos detalhes em que participaram mais de duas dezenas de músicos.
16. Iggy Pop – Post Pop Depression
Em décimo sexto, na lista de discos internacionais de 2016, está uma verdadeira lenda do rock and roll, um homem cuja vitalidade invejável tem inspirado gerações de músicos: Iggy Pop com Post Pop Depression, o disco feito em parceria com Josh Homme, que muitos consideram um regresso aos tempos em que Iggy colaborou com David Bowie. De certo modo, Post Pop Depression faz isso mesmo, recuperar um certo espírito perdido sem o decalcar por completo, por isso foi tão celebrado. Além de Josh Homme que, desempenha o papel que Bowie teve em The Idiot, por exemplo, participa outro Queens of The Stone Age, o multi instrumentista Dean Fertita e o baterista dos Artic Monekys, Matt Helders. Uma super banda ao serviço de um mito vivo que, claramente, ainda não esgotou os trunfos, isto apesar do próprio Iggy Pop ter dito que poderia ser o seu ultimo disco. Não acreditamos. Post pop depression é o décimo sétimo disco de Iggy Pop, está no décimo sexto lugar na nossa lista de 30.
15. Kaytranada – 99.9%
Em décimo quinto lugar na lista de 30 discos internacionais do ano, a estreia de um produtor que se movimenta na orbita do hip hop mas não fica preso a ela. Kaytranada, o haitiano tornado canadiano que começou por ser uma estrela do soundcloud com remisturas que se tornaram míticas, e hoje é uma estrela que actua em Festivais como Montreaux. Com o álbum 99.9%, um disco de raiz e métodos hip hop, Kaytranada desafia as convenções e os géneros e revela-se um mestre dos poliritmos, o que está em total sintonia com as suas raízes haitianas.
99.9% é uma mistura complexa e divertida de funk, soul, r&b, jazz e hip hop com apelo de pista de dança e brilho extra dado por gente como Anderson .Paak, Aluna George, Little Dragon ou Phonté . Aos 23 anos, Kaytranada é um dos nomes em ascensão na musica actual e 99,9% o álbum de estreia é só o começo.
14. Bon Iver – 22, A Million
Talvez 22, A Million não fosse o disco idealizado pelos fãs mais ortodoxos de Bon Iver. As suas origens acústicas e rurais estão aqui bastante pálidas. 22, A Million é um disco urbano, moderno que usa convictamente técnicas digitais. Um disco experimental, denso e bastante pessoal. Justin Vernon admitiu ter procurado ajuda médica para lidar com a ansiedade e depressão antes de fazer 22, A Million e, se escutarmos bem, isso está nas canções. Talvez as suas atribulações existenciais tenham levado o guru da indie folk a explorar novas ideias, testar novas possibilidades sónicas, aproximar-se da soul e do r&b e até escolher uma capa graficamente forte, com títulos das canções escritos em caracteres inspirados em numerologia, runas e linguagem de internet. Críptico e desafiante, 22, A Million de Bon Iver é décimo quarto na nossa lista internacional.
13. Angel Olsen – My Woman
Curiosamente, tal como Bon Iver, também Angel Olsen começou na folk, também My Woman é o seu terceiro álbum e, já agora, também rompe com as expectativas. My Woman mostra uma Angel Olsen segura de si, das fantásticas capacidades da sua voz, das emoções que a perturbam ou divertem e do caminho ou caminhos que quer seguir musicalmente. Um disco que é uma afirmação de identidade, pop de guitarras com ecos de folk dos anos 60, glam rock, blue eyed soul, pós punk… até sintetizadores. Angel Olsen com controle total sobre si e a sua obra em My Woman.
12. Kendrick Lamar – Untitled Unmastered
O ano passado, Kendrick Lamar liderou a nossa lista de melhores discos internacionais do ano com To Pimp A Butterfly. Este ano volta a estar entre os melhores com um registo surpresa lançado discretamente no início de 2016. Um disco sem titulo, ou de titulo Untitled Unmastered, em que as canções são numeradas ou rotuladas com datas. Não é por não dar nome às coisas que a mensagem é menos proeminente. Kendrick, mc de rimas rápidas e precisas, continua a ser um dos mais eloquentes e sagazes comentadores da realidade americana e das dinâmicas socio políticas. Untitled Unmastered não só confirma as suas skills como rapper e poeta, mas também uma atitude particular perante o circo mediático e o estrelato a que ascendeu nos últimos anos. Apesar de ser visto como um profeta, até mesmo um messias do hip hop, Kendrick mantem distância, não desarma o espírito crítico, nem criativo, e assim reforça uma posição intocável.
11. Andrew Bird – Are you serious?
Chegamos ao décimo primeiro lugar da nossa lista de melhores discos internacionais do ano com um trovador dos tempos modernos conhecido pelo assobio cristalino. Andrew Bird com Are You Serious, um disco sobre o casamento, a paternidade, a família, o amor e a doença – no fundo o momento actual na vida do cantautor e violinista americano. Are You Serious é um disco de mudança mas não é um disco de ruptura, está em continuidade com o folk rock de baixa fidelidade que sempre caracterizou Bird, apesar de produção e harmonias vocais terem momentos bastante complexos neste disco. Are You Serious é, na verdade, uma espécie de regresso às origens depois de nos últimos anos ter lançado discos mais experimentais como o instrumental Echolations: Grand Canyon. Canções pop apuradas e inteligentes que se colam a nós mesmo quando falam de assuntos pesados, como “Roma Fade”, com referências à radioterapia feita pela mulher. “Are You Serious?”
Especial Melhores Discos Internacionais 2016 (Episódio 2)
10. Radiohead – A Moon Shaped Pool
Pode não parecer mas os Radiohead estão juntos há mais de 30 anos, desde 1985. São claramente uma banda de culto. A Moon Shaped Pool é o nono álbum, surge depois de um silencio de 5 anos e do divórcio de Thom Yorke. É verdade que Yorke e as suas atribulações existenciais sempre pareceram o leme da banda, e isso continua a ser verdade no novo álbum, mas A Moon Shaped Pool é um disco de ansiedade controlada. Continua a haver tensão, mas o turbilhão é menos dramático, as melodias são mais redondas e Jonny Greenwood exercita nos Radiohead o que aprendeu a fazer bandas de sonoras de filmes e televisão, criando magníficos arranjos de cordas para a London Contemporary Orchestra. Sempre enigmáticos, emocionais e existencialistas, os Radiohead continuam a desafiar-se e desafiar-nos, desta vez deixando entrar mais luz do que é costume no habitualmente sombrio cenário em que gostam de se movimentar.
9. Frank Ocean – Blonde
Era certo que os Radiohead iriam constar no nosso best of de 2016, estão em décimo com A Moon Shaped Pool, mas a nona posição da lista poderá ser mais surpreendente: Blonde de Frank Ocean, um dos casos do ano, por assim dizer. Blonde é o segundo álbum de Frank Ocean, promovido em 2012 a estrela pop com Chanel Orange. Blonde foi antecedido pelo lançamento de um disco visual chamado Endless, saiu com uma revista de 360 páginas chamada Boys Don’t Cry, e tem alinhamentos diferentes em formato físico e digital. Blonde é um dos discos mais estranhos e surpreendentes de 2016. Podemos chamar-lhe r&b psicadélico, hip hop narcótico com batidas espartanas mas, na verdade, é difícil colar-lhe um só rótulo. No disco participam de forma efectiva, mas mais ou menos discreta, Beyoncé, Kendrick Lamar, Kanye West, André 3000 ou James Blake e as canções têm samples de Stevie Wonder, Beatles, Gang Of Four ou Elliot Smith… A lista de créditos de Blonde é imensa e fornece pistas sobre a inspiração, os métodos e a vontade subversiva de Ocean neste segundo álbum.
8. Beyoncé – Lemonade
Lemonade é o sexto álbum de Beyoncé, um disco sobre adultério mas também sobre a reconciliação. Para lá das especulações sobre se “Lemonade” é ou não autobiográfico, consideremo-lo como um disco cinemático, com uma história para contar, até porque é visual, todas as canções têm um vídeo e a narrativa tem final feliz. “Lemonade” faz justiça à máxima em que se inspira: “se a vida te dá limões, faz limonada”. Tem atitude, é frágil e forte, doce e ácido nos momentos certos, uma afirmação do poder feminino com produção hip hop arrojada. Uma história bem contada, dinâmica nas emoções e na produção, com participações de Kendrick Lamar, Jack white, The Weeknd, James Blake ou Ezra Koening dos Vampire Weekend. Diplo produziu duas canções e tem samples de Led Zeppelin, Animal Collective e Malcolm X.
7. The Last Shadow Puppets – Everything You’ve Come To Expect
Everything You’ve Come To Expect é o segundo álbum da dupla Alex Turner e Miles Kane, os Last Shadow Puppets. O novo disco é tudo o que esperávamos e mais, sobretudo nos arranjos de cordas luxuriantes permitidos pelo privilégio de ter uma orquestra de 29 elementos a tocar partituras de Owen Pallet. As cordas são de resto dominantes no novo disco dos Last Shadow Puppets, banda que sempre gostou de cultivar um imaginário retro vintage e continua a viver essa fantasia, ancorado agora, não só na pop dos anos 60, mas também no soft rock e até funk dos anos 70. Everything You’ve Come To Expect é como uma colecção de fotos de outros tempos, um filme sobre jovens endinheirados, à deriva na boa vida, um disco com drama, emoção e canções que não precisam de mais do que 3 minutos para nos agarrar.
6. Whitney – Light Upon The Lake
Sexto na lista de melhores do ano, Light Upon the Lake de Whitney, banda liderada por Mark Kakacek e Julien Ehrlich, dois ex-Smith Westerns, banda de culto da cena indie americana. Talvez por isso alguns apelidem Whitney de super grupo, até porque Ehrlich foi entretanto baterista da Unknown Mortal Orchestra, mas a sua atitude discreta tem muito pouco a ver com títulos de super seja o que for. Na visão dos dois fundadores “Whitney é um tipo solitário que vive sozinho e bebe demais”. É essa a perspectiva de Light Upon the Lake, um disco melancólico nas palavras e nas melodias, agridoce na emoção, mas com drama em tons suaves. Folk luminosa com raízes na tradição americana mas genuína vontade de ser pop.
5. Car Seat Headreast – Teens Of Denial
Teens Of Denial, de Car Seat Headrest, um disco sobre a passagem da adolescência à idade adulta com todas as cicatrizes e desencantos que isso envolve. Will Toledo, 23 anos, tem sido uma espécie de agente provocador do indie rock americano, primeiro com uma série de discos lançados na plataforma Bandcamp, 12 registos desde 2010 que chamaram a atenção e começaram o culto, e agora com Teens Of Denial primeiro disco de originais para uma editora a sério: a Matador que começou por lançar uma compilação da banda antes deste disco. A energia lo-fi, a honestidade e acidez das letras, a dinâmica das canções e os ecos dos anos 90, fazem de Car Seat Headrest um dos projectos mais estimulantes do actual indie rock.
4. Pj Harvey – The Hope Six Demolition Project
Do indie rock com problemáticas de crescimento de Car Seat Headrest, à análise madura e politica de uma heroína rock dos últimos 20 anos: Pj Harvey com The Hope Six Demolition Project em 4.º na lista de melhores discos internacionais de 2016. O disco, o nono da discografia de Polly Jean, nasceu de viagens ao Afeganistão, Kosovo e Washington com o realizador Seamus Murphy, viagens que serviram para documentar os cenários de guerra e pobreza e deram também origem a um livro de poesia e fotografia chamado The Hollow Of The Hand e uma instalação de arte que consistiu na gravação do disco numa sala com parede de vidro que permitiu a quem estava de fora acompanhar todo o processo. Depois de ter centrado o olhar na Inglaterra no anterior Let England Shake, Polly Jean Harvey alarga o espectro de atenção para um cenário mais global. The Hope Six Demolition Project é um disco de forte mensagem politica e tom perto da reportagem jornalística, tudo suportado por rock com músculo e garra.
3. Anderson .Paak – Malibu
Chegamos ao top 3 dos melhores discos internacionais do ano com um multinstrumentista, produtor, Mc e cantor que funde soul, nova e clássica, hip hop, jazz e funk num dos discos que gerou maior unanimidade este ano: Malibu de Anderson .Paak. Paak já era conhecido no underground de Los Angeles mas a revelação ao mundo aconteceu com Compton, álbum de regresso de Dr Dre em 2015 – Paak participou em 6 das faixas, mas um ano antes disso já lançado Venice, um primeiro disco que passou relativamente discreto, e alguns EPs como Breezy Lovejoy. Malibu é o disco que o catapulta para fama e faz dele uma das figuras do momento e dos heróis hip hop do ano. Partindo de cenas reais da sua história de vida dramática, incluindo violência domestica, toxicodependência parental e ficar sem emprego e sem casa com a mulher e o filho, Malibu é um disco transbordante de ideias e cheio de vitalidade, em que colaboram alguns dos produtores da lista A do hip hop actual, como 9th wonder, kaytranada, Hi Tek e Madlib, além de uma banda coesa e bem oleada chamada da Free Nationals, que acompanha Paak ao vivo.
2. David Bowie – Blackstar
É um disco obrigatório sob todas as perspectivas, mas menos por ser o derradeiro de uma artista de culto, e mais por ser um dos melhores discos que esse mesmo artista lançou nas últimas décadas. Bowie com Blackstar, o disco que saiu sem pré-aviso, 3 dias antes da sua morte e por causa disso ganhou uma carga simbólica que parecia não estar lá antes, mas parece clara depois. Blackstar é Bowie em auto análise, existencial e estética, acompanhado pelo velho amigo Tony Visconti e um grupo de músicos ligados ao jazz e à electrónica. Experimental na forma, sonicamente arrojado e com grande peso dramático, o vigésimo quinto álbum de Bowie é um disco com várias camadas que parece revelar novos significados a cada nova audição – coisa que todos os discos querem, mas só os realmente bons conseguem.
1. BADBADNOTGOOD – IV
Surpreendente primeiro lugar para o quarto álbum de uma banda canadiana que mistura hip hop instrumental e jazz e que, em grande medida, era praticamente desconhecida em Portugal, apesar de já ter um culto internacional considerável: BADBADNOTGOOD, grupo canadiano que, no ano passado, lançou um disco com Ghostface Killah, chamado Sour Soul, e que sempre se movimentou nas margens das correntes dominantes, mas que parece ter chegar ao mainstream, ou perto disso, com IV. A isso não são certamente estranhas as canções, antes ausentes do repertório da banda, mas que aqui surgem com vozes como as de Charlote Day Wilson, o rapper de Chicago Mick Jenkins, ou Sam Herring, dos Future Islands. Ainda experimental, como os anteriores trabalhos da banda, mas com arestas limadas e maiores ambições, IV, de BADBADNOTGOOD, é um disco fervilhante de ideias. O disco internacional de que mais gostámos em 2016.
Especial Melhores Discos Internacionais 2016 (Episódio 3)
Voz: Nuno Reis
Texto: Isilda Sanches
Sonoplastia: Luís Franjoso
Produção: Ricardo Sérgio