2020 foi um ano estranho, seja qual for a perspectiva. Foi o ano em que a realidade suplantou toda a ficção, plantando-nos, de máscara na cara, no que parece um conto distópico sobre um amanhã distante. Em livros e filmes, confesso que o assunto é sempre apelativo, mas na vida real esse exercício intelectual catastrofista toca na pele e não há como manter distância crítica das tragédias que a pandemia criou, desde logo nas artes, e em particular na música.
Este foi o ano em que, deliberadamente, dei muito menos atenção à produção estrangeira e mais à nacional, talvez por sentir necessidade de concentrar o olhar no que está perto, desviando activamente o foco do global para o local. Ainda assim, tenho a certeza que passei ao lado de muita coisa – é uma impossibilidade técnica inerente à condição humana, agravada pela grande quantidade de música que se faz actualmente em Portugal em todas as áreas e estilos. Mesmo que quisesse, nunca conseguiria conhecê-la toda, nem em confinamento permanente (ou então preciso de uma optimização do sistema, upgrade de memória ou vários clones…).
2020 foi também o ano em que descobrimos a internet em tudo o que já conhecíamos e ainda mais, como reuniões de trabalho, jantares sociais, directos de todo o lado a toda a hora, conversas com a família e os amigos que não podemos ver cara a cara. Tudo isso sobrecarregou um ano que, em teoria, e pelas drásticas restrições impostas, parecia ter tudo para dar o tempo desejado para a reflexão e auto-conhecimento, mas que, afinal, criou sobretudo overload de informação, muitas vezes falsa. É difícil fazer triagens de 2020. Foram demasiadas coisas em simultâneo e poucas oportunidades de reflectir sobre elas ou fugir das rotinas impostas pelo confinamento.
Pessoalmente, ouvi muita música antiga, redescoberta na minha colecção, muito ambient de agora e do passado, bastantes coisas difíceis de arrumar em prateleiras de estilo e também a matéria prima fresca que se exige nas listas de melhores do ano. Sei que faltam aqui nomes que até considero importantes e sei que, no futuro próximo, vou descobrir discos que deveriam estar aqui e (ainda) não estão. Por isso nunca fecho realmente estas as listas (e gosto sempre de usar o plural para o caso, provável, de fazer várias versões)
Que em 2021 possamos fazer aquilo que foi impossível em 2020! Que possamos voltar a dar abraços e beijos, ver música ao vivo e dançar juntos como antes!
Isilda Sanches
ÁLBUNS INTERNACIONAIS
Molero – Ficciones Del Tropico
Sault – Untitled (Black is)
Linkwood and Foat – Linkwood and Foat
Vários – Breathing Instruments
Kaitlyn Aurelia Smith – The Mosaic of Transformation
Roisin Murphy – Roisin Machine
Sault – Untitled (Rise)
Jessy Lanza – All The Time
Omar S – You Want
Zatua – Sin Existência
CANÇÕES INTERNACIONAIS
Sault – Sorry Ain’t Enough
Sault – Wildfires
Jayda G – Both of Us
Roisin Murphy – Game Changer
Moodyman – Taken Away
Michael Kiwanuka – Rolling
Perfume Genius – On The Floor
Fontaines DC – Liberty Belle
Idles – Mr Motivator
Jarv is – House Music All Night Long
ÁLBUNS NACIONAIS
Nídia – Não Fales Nela Que A Mentes
Magina – Olímpia
Império Pacifico – Exílio
Blacksea Não Maia – Máquina de Vénus
Bonfim – An Extended Play Record Of Assembled Sounds For Different Kinds of Moods
Drumming GP – Textures and Lines
Maria Reis – Chove Na Sala Água nos Olhos
Da Chick – Conversations With The Beat
George Silver – Santo André
João Pais Filipe – Sun Oddly Quiet
CANÇÕES NACIONAIS
Glockenwise + Rui Reininho – Calor
Império Pacifico + Maria Reis – Nitsusada
Nídia – Capacidades
Capicua – Circunvalação
Benjamim – Vias de Extinção
Batida feat Spaceboys – Do The Right Thing
Luta Livre – Iniquidade
Maria Reis – Resquício
Vaiapraia – Fogo Fera
Branko – Sereia Remix
e ainda:
As editoras Holuzam, Príncipe, Percebes, Infinita, Extendes, Noshedoesn’t, Shift Imprint, Subciety Records, o projecto colaborativo Máquinas em Movimento de 2jack4u, os discos de Joana Guerra, Cabrita, Selma Uamusse, Isac Ace, Rabu Mazda, Silvestre, Moreno Ácido, Paulo Vicente, o projecto Bandé Gamboa com música da Guiné Bissau e Cabo Verde… (deixo fim em aberto porque o trabalho continua)
SÉRIES
Fui muito pouco ao cinema e vi alguns episódios de séries que não fizeram diferença nenhuma, por isso rapidamente desisti delas e passei à próxima. Estas 10 agarraram-me e deram-me a volta (e o Queen’s Gambit fez-me ter vontade de voltar a jogar xadrez e de renovar o guarda roupa, suponho que também sejam efeitos do confinamento).
I May Destroy You
Giri/Haji
Small Axe
The Night of
Mandalorian 2
Save Me too
The Queen’s Gambit
Des
Devs