Foi há 60 anos que o quarteto de Liverpool lançou Please Please Me, o primeiro registo musical de John Lennon, Paul McCartney, George Harrison e Ringo Starr. Embora a premissa inicial fosse a de capturar a dinâmica e a energia ao vivo no Cavern Club – pequeno bar em Liverpool que juntou os The Beatles e onde tocaram quase 300 vezes entre 1961 e 1963 – Please Please Me foi gravado em estúdio. Depois de George Martin (conhecido como o quinto Beatle) testemunhar o potencial da banda uma e outra vez (já que era frequente serem convidados para atuar no Cavern Club) o grupo pareceu-lhe uma futura promessa, daí que, pouco tempo depois, se tenha tornado produtor da banda. Em fevereiro de 1963, marcou três sessões para a banda no EMI Studios (atual Abbey Road Studios).
Os jovens rapazes estavam cansados de tocar em Liverpool e Hamburgo e sentiam-se assombrados pela possibilidade de estarem a estagnar na música, já que não tinham o reconhecimento e popularidade desejada. Dada a oportunidade, demoraram apenas nove horas para gravar Please Please Me, no dia 11 de fevereiro, procurando ao máximo uma representação fiel daquilo que se viveu no Cavern Club. O grupo deixou George Martin surpreendido, já que nunca perderam o fulgor durante o longo dia de gravação; pelo que contrário, soavam cada vez melhor – contou Martin em entrevista.
A capa de Please Please Me foi tirada na sede do Emi Studios.
No primeiro single – “Love Me Do” – a harmónica e a voz de Paul McCartney são peça central. A música mostra o arquétipo que verificou a utilidade da simplicidade na fórmula pop, explorada até ao tutano pelo quarteto até A Hard Day’s Night (1964), ponto de viragem para a banda, que a partir de então desbravou o seu caminho. O lado b “P.S I Love You” segue a mesma fórmula simples e contagiante do single, retratando a história de um casal separado pela distância, e tornando evidente a capacidade da música como máxima afirmação de amor – antes ainda de qualquer yeah yeah yeah entusiástico. Mais tarde, surgiu o single “Please Please Me”, autoria de John Lennon que a escreveu na casa da sua tia Mimi – familiar pela qual Lennon nutria grande carinho – a canção “Please Please Me” nasceu da tentativa de Lennon para escrever uma música semelhante ao estilo do americano Roy Orbison, uma espécie de versão acelerada de “Only The Lonely”. Já o título foi inspirado na música “Please” de Bing Crosby, onde a palavra please é utilizada duas vezes no jocoso jogo de palavras: “Please, lend me your little ears to my pleas’[e]” – algo que intrigou Lennon. O seu companheiro, o lado b “Ask Me Why” serviu de mote para o conjunto de canções em Please Please Me onde é perpetuada a mais honesta e frontal declaração de amor.
“Do You Want to Know a Secret” – protagonizada pela voz rouca de George Harrison – foi inspirada no tema “I’m Wishing” do filme de animação Branca de Neve e os Sete Anões de 1937 que a mãe de Lennon, Julia, cantarolava para ele quando era criança. Ringo Starr também foi estrela em “Boys” uma cover das The Shirelles, numa espécie de hino sobre o fim da adolescência, em tom acelerado e divertido.
A dupla Lennon-McCartney cedo se mostrou frutífera no seu lirismo – a colaboração foi extensiva até 1970 – as harmonias de Lennon, McCartney e Harrison maravilharam qualquer um que as ouvisse, e não faltava muito tempo para Starr consolidar o seu talento enquanto baterista. Causaram a euforia – o fenómeno Beatlemania – condição sem idade ou género, que apanhava qualquer pessoa que ouvisse o quarteto.
Ninguém o esperava, mas aconteceu: Please Please Me chegou ao topo da tabela em maio e manteve-se lá durante trinta semanas consecutivas, apenas para ser substituído pelo segundo trabalho da banda With the Beatles, lançado em novembro do mesmo ano. Please Please Me foi a porta de entrada para o sucesso de uma banda que estratificou aquilo a que chamamos hoje música (e cultura) pop e cuja influência na música é histórica e inegável. Recordar Please Please Me – ou o plástico que se tornou ouro – também é recordar o início de uma aventura musical irreversível que abalou o nosso mundo.
Catarina Fernandes