Passaram já vinte anos desde que Dan Bejar começou a partilhar as suas músicas assinando Destroyer. Canções tão interessantes quanto impenetráveis muitas delas apenas editadas nas defuntas (será?) cassetes.
Duas décadas que tiveram um pico de exposição popular com a edição de Kaputt (2011) mostrando agora as canções de Bejar muito mais domadas. Poison Season não só quer estar à altura da herança pop de Kapputt como tem ambições classicistas. A partir de Toronto, em conversa com a Antena3, Dan Bejar fala do que mudou em 20 anos e do desafio que foi pensar para além do rock.
Podem escutar na íntegra a entrevista de Luís Oliveira a Dan Bejar, onde o músico fala ainda de Dylan, Van Morissom e do que mudou com a chegada dos quarentas.
Ao fim deste anos todos de carreira, que importância tem editar novas músicas?
É o mesmo impulso. Depois de feito o disco é algo diferente e nem sei bem o que é (…) mas a parte da composição, a parte artística de compor os temas e depois tocá-los ao vivo é o que me mantém entusiasmado.
É óbvio que o processo de gravação foi mudando mas, no que diz respeito à composição, houve algo que se alterou durante estes anos?
A grande mudança é que, ao compor, deixei de tocar instrumentos. Eu começava na guitarra e com palavras que chegavam não sei bem de onde. Era assim nos 90 e no início dos anos 2000.
Agora as coisas chegam-me de forma junta. Na minha vida banal, quando caminho na rua, por exemplo.
Eu não sou dos que compõe no estúdio. Tenho que ter tudo na cabeça antes de lhe chamar uma canção.
Como guarda essas ideias?
Normalmente vem-me um verso ou um refrão que sussurro para o telefone. Vou-me lembrando de fragmentos que depois junto antes de entrar em estúdio. Penso nos acordes e numa estrutura mínima.
Depois, como aconteceu no Poison Season, partilho isso com a banda de forma a ser construído como se qualquer pessoa conseguisse tocar essa música.
Há uma ambiência clássica por todo o disco mais notória que nos discos anteriores. De onde veio esse som?
Eu cresci a ouvir rock mas no Poison Season pensei para além do rock.
Uma parte de mim pensava em canções pop clássicas: I Love Yous Porgy ou Lush Life. Standarts de jazz, grandiosos e melancólicos.
Muita coisa pré rock and roll. Nalgumas canções, revisitei o que os Destroyer faziam no início, há 15 anos. Aquela ambiência de meados de 70, Lou Reed, David Bowie, com aquela onda de balada nocturna.
Não houve um confronto nessas duas visões?
Foi uma luta gigante. Eram dois caminhos artísticos muto afastados.
Um natural: eu e a banda no estúdio, numa estética que conhecemos e que fazemos facilmente. E isso foi quase tudo gravado ao vivo.
Mas a parte orquestral aconteceu mais tarde, mais lentamente e era tudo novo para mim tendo sido independente de tudo o que a banda tinha feito até então.
Só no fim ia perceber se a ideia funcionava. Algumas canções ficavam meio esquizofrénicas, começando com um combo pequeno e cresciam para ambiências dos 60 com um banda de jazz/swing/rock. Tudo em 3 minutos.
Esse foi o lado mais experimental e que causou tensão. Mas isso é do mais interessante na música pop.
Nunca temeu perder o controlo?
Não, porque eu não sou assim. Não sou o Brian Wilson que tinha todos os arranjos na cabeça.
Na música, eu não sou o Prince ou o Brian Wilson. Eu fico nas mãos dos meus colaboradores. Tenho que trabalhar com quem gosto, com quem acho que tem uma abordagem interessaste na música ou na maneira como tocam os seus instrumentos
Chegaram músicos da área clássica que não conhecia e que falavam uma língua diferente da minha. Por isso fiquei na mão do arranjador e do maestro da orquestra que também tocava violino.
Eles é que lideraram essas sessões.
Canções como “Times Square” ou “Bangkok” colocam a canção em sítios particulares. Parece estar a aprimorar uma visão cinematográfica.
Adoro essa ideia. Era algo que não estava presente nos discos de Destroyer até os últimos dois trabalhos.
Desta vez, queria assumir essa vertente e isso nota-se nas diferentes versões de “Times Square” que abrem e fecham o disco e em muitos dos arranjos. Eu não sei nada de clássica mas tudo o que me pode inspirar veio de bandas sonoras de filmes.
A cultura pop carrega o mito do difícil segundo álbum. No seu caso, a exposição pública chegou com Kaputt. Por isso, para muita gente, este é o segundo disco de Destroyer.
Quero mudar esse mito para o difícil décimo álbum. Soa melhor. É importante que todas as pessoas façam o difícil décimo álbum.
Mas essa exposição com o Kaputt aumentou a pressão ou ela chegou numa fase já mais apaziguada da carreira?
Não senti pressão nenhuma.
Quem conhece minimamente o trabalho de Destroyer, para além de Kaputt, sabe que este não é o disco mais difícil. Fiz discos bem menos acessíveis. Queria fazer um disco bonito e cantar de forma o mais bonita possível, que é algo que nunca associam ao meu trabalho.
E passou muito tempo entre este disco e Kaputt. Foi fácil esquecer Kaputt.
Sou humano e preocupo-me com essas coisas mas só depois de o disco estar cá fora. Aí pensamos como lidar com isso. Mas no processo de gravação e composição o mundo não me entra assim.
Tenho 40 anos e fiz 9 discos. Estou velho para mudar os meus hábitos.
O seu pai era espanhol. Nas passagens pelo Sul da Europa notou alguma especial atracão mais apaixonada pela sua música. Lembra-se dos espectáculos cá?
Os espectáculos que dei em Lisboa foram dos meus favoritos na Europa, a banda adora ir lá e os concertos foram mesmo bons.
Sinto-me ainda um novato na Europa. Toquei bastante desde Kaputt mas comecei tarde e ainda não percebi as diferenças entre os públicos europeus e americanos. Mas, dito isto, sinto-me melhor nessa parte do mundo.