Fotografia: Antony Crook
2021 é um ano especial para os Mogwai.
A banda escocesa celebra os 25 anos da edição do primeiro single e da criação da sua própria editora, mas, para eles, pouco mudou desde os primeiros ensaios em Glasgow. O Daniel Belo falou com o guitarrista e compositor dos Mogwai, Stuart Braithwaite, numa conversa que passou pelo novo álbum editado hoje, As the Love Continues, mas em que também se falou da independência da Escócia e da ligação entre a música e as estrelas.
O que vos mantém juntos e com vontade de fazer música ao fim de 25 anos?
Gostamos de nos encontrar e de fazer nova música e novos sons juntos. Gostamos de viajar, quando ainda se podia viajar, e mostrar a nossa música às pessoas. Nada disso mudou. Claro que temos o dobro da idade que tínhamos quando começámos, mas a razão para o fazermos é exatamente a mesma.
Estes aniversários redondos são ocasião para reflexões?
Acho que vais percebendo coisas ao longo do caminho. É uma viagem, não é apenas uma linha reta. Não estamos a fazer o que fazíamos quando éramos miúdos, mas o essencial — nós pegarmos nas guitarras, bateria e teclados para fazermos música — é exatamente o mesmo.
Falando em viajar, é duro não poder fazê-lo? Custa não poder tocar e ver outras bandas ao vivo, como eu te vi ao lado do palco a espreitar os Cure no NOS Alive 2019?
Sim. Eu tenho muita pena dos adolescentes que estão a entrar no mundo da música porque estão a ser privados de um tempo verdadeiramente mágico da sua vida. Os Cure foram a primeira banda que vi ao vivo, quando tinha 14 anos. Partilhar palco com eles foi uma honra. Eu estou sempre a beliscar-me e a pensar na sorte que tenho.
E o livestream não substitui esses momentos.
São coisas diferentes. É como um programa de televisão. É fixe poderes ver música na TV mas não é igual a estares na mesma sala a partilhar a mesma experiência da pessoa que está ao teu lado, mas por agora o livestream é um bom segundo classificado.
O novo disco, As the Love Continues, pareceu-me um pouco mais abrasivo que o álbum anterior.
Não sei dizer ao certo. Estive tão imerso nele que é difícil dizer. Talvez seja. A maior parte de ambos os discos foi tocada ao vivo e neste talvez haja um pouco mais de grunge, mas isso nunca será uma coisa má.
O álbum arranca com um pulsar tranquilo que dá lugar a uma explosão. Intimidade e euforia. Serve como preparação para o que vamos encontrar?
Penso que sim. Eu encaro sempre a primeira faixa como a abertura, a introdução ao álbum que depois se revela quando o volume sobe. Gosto muito de como a música ficou.
Há também músicas no disco que soam cinemáticas. Como bandas sonoras. É o vosso trabalho paralelo de fazer música para filmes que está a entrar na música dos Mogwai? Era inevitável que assim fosse?
Acho que sim. Quem gosta da nossa música sempre achou que ela tem esse elemento associado. Eu gosto de fazer bandas sonoras que soam como um álbum de rock ou ter faixas de um álbum que podiam estar num filme gosto muito desse estranho cruzamento.
E também li que aprecias a diferença de ter alguém a determinar o trabalho nos filmes, em contraponto à liberdade total de criação nos Mogwai enquanto banda.
Sim. É bom haver um equilíbrio entre esse tipo de organização de que falas e conseguires libertar-te e quase desligar a mente para veres onde a música te leva.
Essa vontade de evasão já vem de criança? O teu pai construía telescópios, e tu passavas muito tempo a olhar para o céu quando eras miúdo.
Acho que sim. Acho que há uma sensação de maravilha quando olhas para as estrelas e tudo é quase grande demais para compreenderes. Sinto o mesmo em relação à música, que é tão emocional e poderosa. É difícil de perceber, mas eu acho que há um paralelo entre a música e as estrelas.
De volta à terra, COVID-19 e Brexit, tudo ao mesmo tempo.
Não tem sido nada fácil. Os últimos dois anos — desde o referendo na Escócia — foram muito dececionantes, mas acho que o sentimento mudou e a maior parte dos escoceses apoia agora a independência. Parece quase inevitável agora.
E a trapalhada do Brexit pode ter ajudado a cimentar essa ideia.
Sim. Definitivamente, tudo mostra que foi um grande erro e as pessoas começam a aperceber-se disso. Não foram os escoceses que erraram, mas são os escoceses que têm de viver com as consequências. Acho que isso acordou muita gente.
Além de tudo o resto, as digressões na Europa podem tornar-se mais complicadas. Isso preocupa-te?
Não me preocupo muito connosco porque somos uma banda estabelecida, mas acho que pode ser um problema para artistas mais jovens que estão a começar. Estou mais zangado do que preocupado com isso.
Este disco pode ser uma panaceia para esse ou outros sentimentos negativos. O álbum pode ser terapêutico em tempos de confinamento?
Sim. Acho que é importante. A música é um refúgio para as pessoas, e estamos numa altura muito complicada, em que a vida das pessoas é muito difícil. É por isso que fazemos música, para de alguma forma podermos ajudar quem precisa.