Em 2025, Braga propõe um programa artístico focado nos artistas afrodescendentes para celebrar 50 anos das independências dos PALOP, com o apoio da Antena 3.
De 18 a 20 de setembro de 2025, Braga será o palco do PARAÍSO, um programa artístico multidisciplinar que este ano celebra os 50 anos das independências dos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP). Organizado em três eixos — Performance, Pensamento e Mediação —, o PARAÍSO regressa à cidade para amplificar e refletir sobre as expressões artísticas afrodescendentes, prometendo uma imersão em narrativas essenciais a partir das margens e dos arquivos.
Os destaques vão para a nova criação de Dino D’Santiago, Adilson, as estreias da Banda Monte Cara e de Fidju Kitxora em Braga, entre algumas das propostas que cruzam cinema, ópera, música e debates cruciais sobre memória e futuro.
Cinema e Pensamento: Abrir Caminhos com Memória e Diálogo
O PARAÍSO tem início a 18 de setembro, no gnration, com a exibição do aclamado documentário Independência (2015), do realizador angolano Mário Bastos. Conhecido também como Fradique, Mário Bastos, nascido em Luanda em 1986, é uma das vozes mais talentosas e expressivas do cinema angolano contemporâneo, tendo cofundado a Geração 80. O filme é uma poderosa reconstituição do processo de luta pela independência de Angola, baseada em testemunhos de combatentes, arquivos raros e imagens inéditas, oferecendo uma perspetiva crucial sobre a nossa memória coletiva.
No dia seguinte, 19, a Livraria Centésima Página acolhe a mesa-redonda “E depois da independência? Das lutas da libertação às lutas de hoje”. Este debate, fundamental para o tema deste ano, contará com a participação dos investigadores Marta Machado, Sheila Khan e Tiago Vieira da Silva, sob moderação de Marisa Rodrigues, e visa discutir identidades, memórias coloniais e os caminhos que se abrem com estas celebrações históricas.
A Ópera Adilson: Uma Viagem Pela Cidadania e Identidade
Ainda a 19 de setembro, no Theatro Circo, o festival apresenta a nova e aguardada criação de Dino D’Santiago: a ópera Adilson. Esta obra inédita em cinco atos, com dramaturgia de Rui Catalão e direção musical de Martim Sousa Tavares, é uma encomenda da BoCA – Biennial of Contemporary Arts. Adilson acompanha a comovente jornada de um homem afrodescendente, nascido em Angola e filho de pais cabo-verdianos, que reside em Portugal há mais de 40 anos sem nunca ter obtido a cidadania portuguesa.
A história de Adilson — chamado D’afonsa pelos amigos, Nuno pela família, Adilson no passaporte — desenrola-se num labirinto burocrático de salas de espera e processos adiados, impedindo-o de ser plenamente reconhecido pelo país onde sempre viveu. Mais do que a história de um indivíduo, a ópera representa as vivências de milhares de pessoas deixadas à margem do sistema, transformando a espera em poesia e a invisibilidade num ato de resistência. No culminar da obra, ecoa a pungente declaração: “Eu não sou português. Eu sou Portugal. Um país à espera.”
Mediação: Percorrer a Cidade e Ativar o Património
O eixo da Mediação é crucial para o PARAÍSO, convidando o público a interagir e aprofundar a compreensão dos temas abordados. A 20 de setembro, os interessados terão a oportunidade de participar numa visita guiada conduzida pelo investigador Chisoka Simões, que percorrerá a cidade de Braga através de um roteiro por espaços com memória e imagética colonial.
À tarde, no gnration, terá lugar a apresentação de uma residência artística realizada na Biblioteca Pública de Braga. Este projeto, conduzido pelo artista plástico Ruben Zacarias, dedica-se à investigação e ativação do património bibliográfico ligado aos PALOP, e a conversa será moderada por Rosa Cabecinhas.
Música: O Legado e a Nova Geração Cabo-Verdiana
A noite de 20 de setembro, o gnration será palco de uma dose dupla de concertos com nomes incontornáveis da música cabo-verdiana. A mítica Banda Monte Cara, referência desde 1976 como epicentro da cultura cabo-verdiana em Lisboa, fará a sua estreia em Braga. Com uma formação que harmoniza a experiência de membros originais com o vigor de novos talentos, o grupo irá revisitar e reinventar a rica herança sonora de compositores como Dionísio Mario, Paulino Vieira, Manuel de Novas, Tito Paris e Pedro Rodrigues, prometendo um concerto que é pura celebração e homenagem a um legado indelével. O repertório incluirá clássicos que marcaram gerações, trazendo o autêntico swing cabo-verdiano.
Na mesma noite, a frescura e a inovação da nova geração chegam com Fidju Kitxora, um dos coletivos mais promissores da cena musical afro-lusófona contemporânea. O seu álbum de estreia, Racodja (2024), presta homenagem à diáspora cabo-verdiana com uma sonoridade crua e documental. Combinando ritmos tradicionais como o funaná e o semba com hip hop, dub e eletrónica, Fidju Kitxora usa o crioulo como matéria política e ato de resistência, procurando “reparar e reconstruir narrativas que nos foram negadas” em performances intensas.
Um Momento para Escutar e Pensar a Partir das Margens
O PARAÍSO reafirma o seu compromisso de ser um espaço onde se escuta e se pensa”“a partir das margens, dos arquivos e das vozes que continuam a elevar a afrodescendência na atualidade”. Num ano tão simbólico para as independências dos PALOP, este momento artístico em Braga propõe uma celebração da riqueza cultural e artística, convidando à reflexão sobre a história, a identidade e os futuros possíveis. Com a coordenação curatorial de Nuno Abreu e curadorias específicas da BANTUMEN para Cinema e Pensamento e de Rosa Cabecinhas (CONCILIARE, CECS, Universidade do Minho) para Mediação e Pensamento, o PARAÍSO propõe uma programação rica e diversificada, que se estende por vários espaços emblemáticos da cidade, como Theatro Circo, gnration, Livraria Centésima Página e ruas da cidade de Braga.
Mais informações e detalhes sobre a programação nos sites oficiais do Theatro Circo e do gnration.