É como se sintonizássemos uma rádio desconhecida, certamente pirata, no meio de um road-movie que não sabemos estar a filmar. Conduzimos por terra de ninguém (o cenário há-de ser a Califórnia da nossa imaginação, até convém que não seja a real) e, de repente, aparece-nos aquele som nas colunas. De onde vem aquilo? De que tempo vem aquela música, de que lugar? É real, fomos nós que a inventámos ou foi o realizador do tal filme em que não sabemos estar que o criou só para nos confundir?
Quando falamos de Ariel Pink a cabeça enche-se destas ideias. É natural e até desejável que assim seja. Porque Ariel Pink, músico de L.A. que não podia ser mais da L.A. do artifício e do glamour, do luxo e do lixo, criou uma ideia de som que soa realmente a uma dimensão paralela. São os anos 1980 da produção sintética reproduzida em cassetes, são os anos 1970 do glam, é a actualidade em que se mistura tudo até não sabermos onde está o fio ou a meada.
Foi exactamente por isso que ele surgiu no nosso radar para não mais sair. Exactamente por isso e por aquele outro pormenor: canções. Exactamente. Ariel Pink é aquilo tudo e um imaculado compositor de canções. Dedicated to Bobby Jameson (história incrível a do Jameson, não é, Quim?) é o grande regresso do nosso homem em L.A. É mesmo. Prestem atenção enquanto aceleramos no filme que não sabemos se existe.
Mário Lopes é jornalista e crítico musical no Público e fala com Quim Albergaria todas as semanas na Antena 3, em O Disco Disse.