O melhor de tudo isto é a possibilidade de ainda sermos surpreendidos passados todos estes anos. Parece que tudo o que existe nos chega a toda a hora, que tudo está mesmo aqui ao lado e que basta estender a mão para o agarrar — claro que, ao mesmo tempo, sabemos que, se temos tudo, temo-lo a passar muito rápido, demasiado rápido, e o que era aquilo que já esqueci?
É por isso, Quim, que foi tão boa ideia teres resgatado esta Vida Ventureira do outro lado do Atlântico. A Bárbara Eugenia, dona dos segredos pop de lá e de cá, e o Tatá Aeroplano, senhor de psicadelismos bem medidos e de um Cérebro Electrônico (era o nome da banda dele) que pensa muito bem, muito livre. Já se tinham encontrado antes, mas isto agora é trabalho conjunto a sério. Agora é um álbum: Vida Ventureira — agarramos no título e já não queremos sair dali.
Folk luminosa e pop feliz e tropicalismo a condimentar. Byrds e Novos Bahianos, sintetizador a apontar o caminho entre a selva e as duas vozes que são asas, que são escadas para voar (lembro-me desta frase algures no disco). Lembro-me de outro, o primeiro de todos: “Vida abençoada é vida devagar”. Ouvimo-lo e fomos logo conquistados. Quer dizer, nestes tempos de tudo tão rápido, como resistir a verso tão certeiro, tão justo?
Mário Lopes é jornalista e crítico musical no Público e fala com Quim Albergaria todas as semanas na Antena 3, em O Disco Disse.