Há de haver qualquer coisa especial ali para os lados da Austrália, não achas, Quim? Sim, é verdade, há coisas especiais em todos os lugares. Mas, na Austrália, parecem acertar nestas coisas em particular. Vieram de lá o Nick Cave e os Triffids, vieram de lá os Radio Birdman, vêm de lá os Tame Impala, os Pond e os King Gizzard & The Lizard Wizard. Vem de lá a Courtney Barnett, que partilha com eles uma forma desassombrada de fazer música, com a sabedoria de escolher o tom certo de dizer e fazer as coisas, mas escolhê-lo sem o exibirem, como se fosse, e parece muito, completamente natural neles.
A Courtney Barnett fez-nos olhar na direção dela quando ouvimos “Avant Gardener”, por exemplo, uma das canções incluídas nos primeiros EP, e não deixou dúvidas quando lemos o título do primeiro álbum, Sometimes I Sit and Think, and Sometimes I Just Sit (estávamos em 2015 e, depois de ler o título, só ouvimos a música para confirmar — só podia ser bom). Rock direto, sem floreados, mas com roll na quantidade certa para assegurar excitação e elegância. E as palavras, ou melhor, aqueles diálogos sonolentos de si para si, a retratar as coisas dos dias e o tédio e as irritações dos dias, só tornavam tudo maior, mais interessante — cantautora’n’roll, isto existe?
Agora, chegou o segundo disco. É a mesma Courtney da mesma Austrália, com aquilo tudo que havia antes. Mas agora há também sombras no quarto da introspeção (“Hopefulessness” é a primeira canção) e, alternadamente, um olhar que se fixa, sem pachorra para ironia ou paninhos quentes (“I’m not your mother, I’m not your bitch”, diz ela a meio).
Mas é a mesma Courtney Barnett da mesma Austrália. Eh pá, e há de mesmo haver qualquer coisa especial ali para os lados da Austrália.
Mário Lopes é jornalista e crítico musical no Público e fala com Quim Albergaria todas as semanas na Antena 3, em O Disco Disse.