Já falámos disto algumas vezes, Quim.
O que faz uma música, um som, parecer que, de alguma forma, nos pertence? Não são os instrumentos usados, não é necessariamente a história passada que carregam certas melodias, não é obrigatoriamente a língua em que se canta ou as onomatopeias criadas. É algo mais nebuloso, indefinível.
Os Dead Combo, que nem cantam, têm essa capacidade de se tornarem nossos, de terem algo de nosso sem que consigamos definir com precisão o quê. Afinal, eles são marinheiros de alto-mar e marinheiros em terra com muita viagem nos ombros. Têm em si as Caraíbas, o deserto americano, ilhas do Atlântico com vista para África, o Mediterrâneo que banha Napóles e a Sicília. Têm isso sendo sempre, sem hipótese de erro, a bunch of meninos de Lisboa. Talvez seja por serem isso tudo, desta forma, que os sentimos tão próximos.
Nesse sentido, Odeon Hotel talvez seja o álbum em que essa identidade múltipla, mas de raízes bem firmes, se manifesta de forma mais abrangente. Tó Trips e Pedro Gonçalves têm falado de como este álbum é um grande salão com várias portas abertas para outros grandes salões. Em todos eles estão gentes diferentes e sons diferentes. O hotel é o mundo deles. O hotel é a Lisboa de hoje. A deles, que nos pertencem.
Deve ser isso, Quim, só pode ser isso.
Mário Lopes é jornalista e crítico musical no Público e fala com Quim Albergaria todas as semanas na Antena 3, em O Disco Disse.