Foto: Bruno Cantanhede
“Ainda nos estamos a descobrir enquanto músicos”
São cinco e vêm de Beja. Hoje moram em Lisboa, para onde viveram trabalhar, estudar e gravar o primeiro disco, homónimo, dos Marvel Lima. Foi nos Pontiaq Studios, ali pela zona da Praça do Chile, que José Penacho, Diogo Vargas, Luis Estanque, João Romão e Diogo Marques fizeram nascer esta “açorda apaellada”, muito por culpa das influências espanholas vindas da fronteira, a pouco mais de 70 quilómetros da terra onde cresceram. A criação levou-os a um disco que mistura algo entre o rock psicadélico latino meio funky.
Os Marvel Lima – fica já a explicação: está relacionado com o verde lima com que pintaram as paredes da sala de ensaio e com a palavra ‘marvellous’ (sim, eles querem ser maravilhosos) – tocam na sexta-feira no Musicbox, mas foi para ficar a conhecer um pouco melhor o disco de estreia da banda que conversámos com José Penacho, vocalista e guitarrista.
Vamos começar por perceber como é que nasceram os Marvel Lima?
O projeto começou há um par de anos, em 2012, talvez. Nós já éramos cinco amigos de longa data, de Beja, com alguns projetos musicais uns com os outros. Já tocávamos há algum tempo. Mas na altura em que começámos, estávamos todos parados, então tivemos esta ideia de fazer um projeto mais ou menos fora da caixa quando comparado com aquilo que já tínhamos feito. E surgiram os Marvel Lima.
Que ideia era essa de fazer um projeto fora da caixa?
Há sempre a tendência de tentar fazer a chamada música alternativa. Seja o pós-rock, seja o indie, ou o eletrónico. Nós tentámos equilibrar todos os mundos, inclusivamente influências que tínhamos, por exemplo, do rock progressivo mais antigo, da música latina, que também ouvíamos muito. Pensámos num conceito mais sui generis que acabou por ficar assim.
A curiosidade pelo vosso disco começou a ser despertada logo com o tema de arranque, que vem com um grande solo de congas. Esse é um dos espelhos da influência da música latina nos Marvel Lima?
Eu e o Diogo [Vargas, teclista] sempre ouvimos muita música cubana: desde Buena Vista Social Club até Cubanitos Postiços ou Marc Ribot… ou mesmo as coisas antigas de Santana. Sempre tivemos a vontade de fazer algo com este toque latino. E depois o Alentejo “sofre” um bocado com a invasão espanhola, algo que também nos influenciou.
“Sempre tivemos a vontade de fazer algo com este toque latino. E depois o Alentejo ‘sofre’ um bocado com a ‘invasão espanhola’, algo que também nos influenciou”
E conseguiram perceber que conseguiam pegar em todas essas influências e dar-lhes uma roupagem rock?
Sim. Mas logo no início pensámos que íamos ter percussões, que tínhamos de ter uma base rítmica forte – com congas para dar essa vibe latina. Depois foi juntar outras coisas, numa espécie de grande cozido à portuguesa (risos) com as influências daquilo que cada membro da banda gosta de ouvir. Cada um depois dá de si à banda. Por exemplo: o João [Romão, percussionista] é formado em jazz; o Luís [Estanque, baixista] é mais do punk, eu sou mais do prog.
É uma variedade grande. Se calhar até são mais umas migas do que um cozido!
(risos) Exatamente. Ou uma grande açorda.
Ainda assim, parece notar-se uma grande influência do funk e em várias faixas: caso do single “Fever”. É curioso dizeres que o vosso baixista é do punk, porque essa é uma faixa com uma tremenda linha de baixo a transpirar funk. Se calhar ele é do “phunk”.
Ele gosta muito de punk, mas gosta muito de funk. São essas linhas de baixo melódicas que se vão ouvindo pelo álbum. Mas maioritariamente a escola dele é a do punk. É giro porque essa música nasce de uma linha de baixo que vem de um engano dele (risos). A ideia não era aquela, mas ficou bem assim. Mas acho que, de certa forma, ainda nos estamos a descobrir enquanto músicos. A sair da zona de conforto, a apostar, a arriscar, a tentar fazer outras coisas.
“O disco tem muitas coisas para escutar – é como um diamante bruto por esculpir”
Já estão a fazer novas músicas?
Sim, sim. Mal acabámos o disco já tínhamos outras pensadas que ficaram de fora e que agora estamos a trabalhar. É um processo contínuo.
Os Marvel Lima têm canções em português, inglês e castelhano. É um álbum multi-linguístico.
As letras são escritas, na maior parte, por mim – com alguma influência e ajuda do Diogo. São letras sobre várias fases da minha vida. Eu trabalhei no Alentejo durante dois anos, na indústria agrícola – sou Engenheiro Agrónomo – que tem muitos espanhóis e está em contacto com empresas espanholas. Isso estimulou-me a escrever também em espanhol. Mas as letras falam um bocado de tudo: o amor, de períodos mais depressivos… ao longo dos quatro anos de disco fui compondo as letras consoante o estado de espírito das alturas. Começámos por fazer experiências. Já que estávamos a fazer linhas melódicas com essa influência latina, pensámos que também poderíamos cantar em espanhol.
Como é que têm sentido a reação do público às vossas canções?
Têm sido bastante positivas. Se calhar o pessoal estava à espera de encontrar um disco na linha de “Fever”, a faixa que deu maior divulgação, mas o disco é bastante eclético. Já várias pessoas me disseram que gostam muito. O disco tem muitas coisas para escutar – é como um diamante bruto por esculpir, e se calhar é isso que vamos fazer ao longo do tempo. O arranque foi para encontrar uma identidade.
“Se calhar o pessoal estava à espera de encontrar um disco na linha da ‘Fever’, a faixa que deu maior divulgação, mas o disco é bastante eclético”
O facto de não se fecharem num só género, também vos abre a mente às vossas novas composições?
Sim, quisemos sempre fazer coisas novas. Temos que inovar sempre naquilo que fazemos. O próximo disco vai ser um desafio, mas estamos prontos. Andámos à procura da nossa identidade, conseguimos encontrá-la e, já no próximo disco, vamos mantê-la ao mesmo tempo que vamos tentar inovar melodicamente.
Uma curiosidade: vocês são todos de Beja. Também são amigos dos Virgem Suta?
Sim, somos bastante próximo deles (risos)! Havia lá a Galeria do Desassossego, que era gerida pelo vocalista dos Virgem Suta, o Jorge Benvinda, onde alguns de nós ainda chegaram a trabalhar. Sempre houve essa proximidade entre as duas bandas e a música.
Entrevista: Bruno Martins