Ao longo do ano, a Antena 3 vai revisitar o punk, canção por canção. Revisitar não só o punk, que eclodiu em Inglaterra há quatro décadas, mas também descobrir, lá atrás no tempo, aqueles que o prenunciaram quando punk não era ainda género musical e, um pouco depois desse tempo, aqueles que dele frutificaram. Revisitar desviando também o olhar para outras áreas do globo. Para sítios como Portugal? Que pergunta. Claro que sim. “Há que violentar o sistema”, não é?”
Buzzcocks – “Orgasm addict”
O punk não foi um corte total com o passado. Representou um novo olhar, num novo tempo. A turbulência económica assolava a Europa, consequência da crise do petróleo, e a Inglaterra, em particular, mergulhava no desemprego e na precariedade (onde é que já ouvimos isto?). Quem acabava de chegar aos vinte anos, ou quem os via aproximarem-se, olhava para o futuro e nada via, apenas incerteza (onde é que também já ouvimos isto?).
Para essa geração, como para todas desde que Elvis abanou as ancas em directo na televisão americana, a música deveria servir de guia e de bálsamo, devia apaziguar as frustrações e oferecer uma hipótese de fuga. Peter Frampton a cantar “Baby I love your way”, qual jovem precocemente envelhecido, não serviria certamente esse propósito. Novos tempos exigiam novos sons, novas atitudes. Foi isso que trouxe o punk: uma banda-sonora para atravessar os dias, uma motivação para aqueles que não tinham voz descobrissem a sua e a partilhassem com todos. Não era preciso construir do zero. Era preciso saber escolher.
Os Buzzcocks, de Bolton, nos arredores de Manchester, são um dos diamantes mais cintilantes da história do punk. A banda de Peter Shelley e de Howard Devoto, que rapidamente saiu para formar os Magazine, representou o estado de graça pop do movimento. Não é por acaso que o seu registo mais acarinhado e celebrado é Singles Going Steady, uma compilação de singles editada em 1979. As suas canções, primorosamente compostas, seguiam a distinta tradição britânica de, por exemplo, Small Faces, The Who ou Troggs. Mostravam também, porque eles ouviram e aprenderam com os Velvet Underground, que o lado negro da vida não só pode ser atraente como é, muitas vezes, aquele que nos representa melhor.
Os Buzzcocks sabiam que não havia temas interditos e que o humor nunca deve ser negligenciado. Começaram precisamente por aí. Uma canção sobre um miúdo viciado em masturbação? Porque não? Chama-se “Orgasm addict” e chegou no final de 1977. Foi o primeiro single dos Buzzcocks e já estava tudo no sítio certo. Clássico absoluto.
Ficha Técnica:
Textos – Mário Lopes
Voz – Daniel Belo
Sonoplastia – Luís Franjoso