São muitos os nomes que a Casa Capitão — o novo espaço cultural lisboeta, situado no Beato, em Lisboa — programou para os próximos tempos. Depois de ter surgido como projeto pop-up durante a pandemia e de um processo de requalificação do edifício, a Casa Capitão afirma-se agora como espaço cultural permanente, com salas de concertos, galerias, restaurante, terraço e áreas multiusos. A Catarina Fernandes escolheu alguns concertos a não perder na programação da Casa Capitão.
Uffie (25 de setembro)
À partida o nome talvez não vos diga muito. É preciso recuar para os tempos do Myspace, entre 2004 e 2008, altura pré-Spotify, Tidal, Bandcamp ou mesmo Instagram — uma vez que o Myspace era uma rede social generalista, que se destacou pela comunidade musical, tecnologia e cultura — e música — pop, em que era possível encontrar música nova, conhecer a agenda e interagir com músicos independentes, de forma mais íntima. Foi no Myspace que, Anna-Catherine Hartley, mais conhecida como Uffie, lançou um conjunto de canções pop excêntricas e provocatórias, em 2005.
Aos 17 anos, a artista franco-americana lançou o primeiro single “Pop the Glock” — juntamente com o b-side “Ready to Uff” — faixa presente em Sex Dreams and Denim Jeans, o primeiro longa-duração de Uffie, lançado em 2010. Altamente influencida pela música eletrónica francesa — em 2007, Uffie já tinha colaborado com os franceses Justice na canção “TThhEe PPaARRtTYY”— pelo electro-pop e pelo hip-hop, na medida em que se aproveitava do spoken word, visto que Uffie nunca “cantou” propriamente em Sex Dreams and Denim Jeans e usou auto-tune a seu bel-prazer.
Com letras provocatórias, sarcásticas e autodepreciativas, “I’m an enternainer, not a lyricist I’m an entertainer, not a lyricist / I’m so far from all you girls out there / If I get popular, I know that ain’t fair”, Uffie nunca se levou muito a sério. Contudo, a paixão pela música sempre esteve lá, “music is the best thing / that ever happened to me / i’m hooked on that thing”, canta em “Neuneu”, faixa que poderia pertencer, perfeitamente, a qualquer álbum dos colegas de editora francesa Ed Bangers Records, Justice. O álbum conta com colaborações de nomes como Pharrell Williams — na canção “ADD HUV” — e Mattie Safer, baixista dos The Rapture, na faixa “Illusion of Love”.
Sex Dreams and Denim Jeans foi um sucesso nos Estados Unidos, espalhando-se como uma epidemia pela Europa, sobretudo em França, com expressão significativa em Inglaterra e na Bélgica. O álbum de estreia de Uffie foi nomeado para os prémios franceses Victoires de la Musique para Melhor Álbum Eletrónico e foi bastante aclamada na imprensa internacional, em jornais como o The New York Post ou na antiga revista Spin.
Uffie desafiou os códigos da pop convencional, abriu caminho para uma pop experimental e alternativa, tornando-a uma figura visionária dos anos 2000 ( “Me and my stupid flow / Me and MySpace / with only 3 tracks a year / and they still talk about me? / Damn”, cantou em “Art of Uff”).
Depois de 2010, Uffie desapareceu do mapa, regressando, ocasionalmente, para colaborar em algum projeto musical, como foi o caso de “Babygirl”, canção de 2017 presente na mixtape Number 1 Angel de Charli XCX. A artista e agora pop star inglesa Charli XCX explicou em entrevista o quão importante foi ter ouvido Uffie no Myspace para iniciar a própria carreira musical, inclusive, cita-a como uma das maiores inspirações. Afinal de contas, antes da Charli, já cantava Uffie, “Yo, I’m a damn crazy brat”, em “Ready to Uff”.
Em 2019, lançou o EP Tokyo Love Hotel e, em 2022, pós-pandemia, Uffie lançou, finalmente, o segundo longa-duração. Sunshine Factory foi produzido pelo músico, produtor e designer norte-americano Toro y Moi e mora numa realidade completamente diferente de Sex Dreams and Denim Jeans: cenário pós-pandemia, com uma sonoridade virada para o ambient, o álbum é uma espécie de ode ao escapismo.
Mais recentemente, em abril de 2025, Uffie lançou o single “Poolside Goth”— produzido por Sega Bodega, músico e produtor de Glasgow — que marca um novo capítulo da artista franco-americana, com uma sonoridade mais virada para o club.
Uffie vai atuar na Casa Capitão, no próximo dia 25 de setembro, às 21h, e o bilhete custa 16,50 euros. Depois do concerto, a cereja no topo do bolo: há DJ set de Hannah Diamond, artista multidisciplinar e membro fundador do influente coletivo PC Music.
Isabella Lovestory (26 de outubro)
Isabella Rivera é Isabella Lovestory. Nascida nas Honduras, na América Central, mudou-se para a América do Norte e depois para Montreal, Canadá, aos 17 anos. Foi em 2020 que Isabella Lovestory começou a traçar o seu caminho entre a pop e o reggaton — chamando à atenção da esfera pública com o single “Mariposa”— com o EP Mariposa, que, um ano depois, deu origem à Remix Mixtape.
Em 2022, lançou o longa-duração Amor Hardcore, com o mesmo tom sensual da mixtape, continuando a cantar sobre o que mais gosta, isto é, “Sexo Amor Dinero”. A Pitchfork descreveu-o como “divertido, maximalista e sedutor até ao âmago” e explica que a música da Lovestory está no mesmo guarda-chuva do perreo-pop; mas reduzir a música de Isabella Lovestory a um género é injusto, uma vez que a artista experimenta e leva mais longe o trap espanhol, a eletrónica gótica, e se deixa influenciar pela pop dos anos 2000.
Isabella Lovestory regressa a Portugal para apresentar Vanity, o mais recente longa-duração, lançado no final de junho de forma independente. Em entrevista, explicou que o novo álbum explora a fragilidade, e, simultaneamente, a eternidade e indestrutibilidade da beleza.
Depois da edição de 2023 do NOS Primavera Sound, no Porto, Isabella Lovestory está de volta, com concerto marcado em Lisboa, na Casa Capitão, dia 26 de outubro, às 20h, e o bilhete custa 18 euros.
Destroyer (25 de novembro)
Dan Bejar assina como Destroyer há 30 anos. Benjar também é conhecido pelo seu trabalho na banda The New Pornographers, mas foi em Destroyer que o cantor, compositor e multi-instrumentista de Vancouver, encontrou o seu ethos artístico. A banda começou com um projeto a solo no fim dos anos 90, como um veículo para o processo criativo de Bejar. Muitos dos primeiros álbuns de Destroyer foram gravados de forma independente, com pequenos orçamentos, mas a banda – que foi crescendo, ao longo do tempo – sempre se destacou pela habilidade em misturar rock, com música experimental e com algumas visitas ao jazz, com uma entrega lírica muitas vezes teatral de Dan Bejar.
A sonoridade de Destroyer tornou-se cada vez mais complexa e refinada. Em 2011, o lançamento de Kaputt foi o ponto de virada na trajetória de Destroyer. Com influências claras de pop barroco, synth-pop e new wave, Kaputt ofereceu um som mais polido e uma produção luxuosa pela dupla JC/ DC (John Collins e David Carswell). A pena de Benjar ficou cada vez mais refinada (“I write poetry for myself / I write poetry for myself”, cantou na belíssima “Blue Eyes”), elevando a categoria em todas as canções, desmascarando dinâmicas sociais, culturais e políticas, através de uma prosa. Foi através de Kaputt que Destroyer atingiram o merecido reconhecimento crítico e conquistaram uma grande audiência.
Em trabalhos mais recentes como Poison Season (2016) ou Have We Met (2020), a banda continuou a explorar uma textura sonora mais sofisticada, com atmosferas de nostalgia e temas que se intercalam entre política, existencialismo e relações humanas, ora num tom melódico ora esotérico.
Em 2025, o bon vivant Dan Bejar e companhia apresentam o novo longa-duração “Dan’s Boogie”, um dos álbuns mais interessantes da banda. Nas faixas encontram-se épicos pop carregados de espetáculo, baladas ao piano e o habitual romance-cinema. Para quem não teve a oportunidade de o ouvir na última edição do NOS Primavera Sound, agora é a oportunidade de vibrar ao som do Dan’s boogie.
O concerto é no dia 25 de novembro, às 21h, em Lisboa, na Casa Capitão, com Eleanor Friedberger na primeira parte, e com o custo de 25,01 euros.
Water From Your Eyes (7 de dezembro)
Water From Your Eyes é o projeto de Nate Amos (cabeçilha de This Is Lorelei) e da parceira Rachel Brown, circa 2020. Água que escorre dos olhos,
Foi ainda durante a pandemia que o duo ganhou notoriedade, primeiro com Somebody Else’s Songs, mas sobretudo com Structure, disco que lhes valeu uma legião de ouvintes. Em 2023, o duo de Chicago lançou Everyone’s Crushed, um álbum que avizinha os fins dos tempos, de uma forma tão experimental como catastrófica (“Cracks a picture on the screen / Yeah, everyone’s crushed / And with everyone around / So everyone drinks”) e tão analógica como digital.
A sonoridade de Water From Your Eyes é uma mistura – ou o equílibrio perfeito – de ruído e harmonia. O que a uma primeira escuta pode parecer demasiado desorganizado, mais tarde ou mais cedo revelasse incrivelmente cativante. Se por um lado estão preocupados em descontruir conveções do indie, do art rock e até do pós-punk, por outro, deixam bem claro que o que lhes interessa é explorar texturas sonoras mais complexas, de forma a criar atmosferas mais densas, acompanhadas com o doce spoken word de Brown.
Ao longo do tempo, o som foi se tornando cada vez mais coeso; com It’s a Beautiful Place o super duo elevou a fasquía, combinando uma série de géneros em cada tema materializado no mais recente longa-duração. Tornaram-se, simultaneamente, mais vanguardistas e acessíveis e abriraram uma nova janela temporal na cena indie contemporânea. “Queríamos apresentar uma vasta gama de estilos de uma forma que reconhecesse que tudo isto não passa de um pequeno instante”, disse Nate Amos em entrevista, sobre It’s a Beautiful Place, álbum que será apresentado na Casa Capitão, em Lisboa, no próximo dia 7 de dezembro. É a estreia absoluta do duo em Portugal. Os bilhetes estão à venda online pela módica quantia de 21,63 euros.
Wavves (1 de março de 2026)
Foi King of The Beach que colocou os Wavves no mapa musical, em 2010. Não foi o primeiro,— os verdadeiros beach goths saberão que o homónimo remonta ao ano de 2008 — mas foi o trabalho de Nathan Williams que marcou uma geração paradoxalmente alienada e ansiosa. A banda de San Diego, Califórnia, é conhecida pela fusão de surf punk, noise pop e garage rock, e tornou-se, rapidamente, uma voz representativa da juventude irreverente norte-americana. A onda expansiva de tudo isto chegou, inclusivamente, à península ibérica com bandas como Mujeres, The Parrots ou Cave Story, difundindo farra garageira.
Em 2013, o quarto longa-duração Afraid of Heights traz uma camada mais introspetiva e emocional, quando comparada com a missa despreocupada e I-don’t-give-a-fuck estampada em King of The Beach. As letras transbordam temas complexos como a ansiedade, a solidão e, inclusive, uma forte (e muitas vezes necessária) autocrítica.
Dois anos depois, V continuou a explorar essas emoções, mas com um tom mais ensolarado e pop, apresentando faixas como “Way Too Much” e “My Head Hurts”. No mesmo ano, os Wavves juntaram-se e fizeram um álbum colaborativo com os parceiros de editora Cloud Nothings, banda de rock alternativo de Cleveland, Ohio.
Em 2017, os Wavves deram um salto ao assinar a editora Ghost Ramp, selado com You’re Welcome. O disco apresenta uma mistura ecléctica de géneros, desde riffs pesados até samples inesperadas, mantendo a essência irreverente de Nathan Williams. Em 2021, lançam Hideaway, produzido por Dave Sitek (TV on the Radio), com uma sonoridade mais madura e introspectiva, abordando temas como o envelhecimento e responsabilidade, bem mais longe dos valores dos tempos áureos de King of The Beach.
Em 2025, e quinze anos depois, mudou não só o panorama à volta dos Wavves, como o próprio espirito do grupo. Lei da vida: passaram da adolescência punk à maturidade power-pop que toma forma em Spun, o seu novo álbum, o primeiro que editam desde 2021. Lançado a 27 de junho, o álbum reune novamente Nathan Williams com Stephen Pope, Ross Traver e Alex Gates, marcando um regresso à formação “inicial” e combina elementos clássicos dos Wavves — guitarras distorcidas, refrões pegajosos e energia punk — com uma produção mais polida.
A discografia é um testemunho da evolução criativa (e emocional) de Nathan Williams, sempre com grandes doses de caos, ansiedade e diversão. Os Wavves estão, definitivamente, de volta em 2025, com a mesma energia de sempre. Esta é apenas a segunda passagem da banda em Portugal. A primeira foi em 2023, no antigo Vodafone Mexefest, festival que contaminava os espaços culturais de Lisboa com música emergente. Em 2025 chega uma nova oportunidade de ver Wavves ao vivo. Brindemos a Wavves, no dia 1 de março de 2026, às 21h, num concerto com apoio Antena 3, cujo bilhete custa 21,63 euros.